Transformação ou Disrupção: Nada mais será como antes na indústria financeira!


A indústria financeira passa por uma mudança gradativa, porém não menos radical que se torna possível premonizar que ela não sobreviverá nos moldes que a conhecemos hoje. A transformação na verdade já está ocorrendo e acelerando. Ao longo dos últimos anos, uma série de pressões concorrenciais tem ocorrido alterando as bases sólidas os bancos foram construídos. Porém isto é apenas a transição de uma jornada de transformação sem precedentes que elevará os padrões desta indústria para um patamar de eficiência e inovação antes impensável. Bom para (quase) todos!

 

A concentração bancária

Os grandes Bancos, fruto de várias incorporações, construíram ao longo de décadas uma barreira natural de proteção dentro do seu eco-sistema através de infraestrutura robusta, serviço bem verticalizado e integrado em si mesmo com portfólio completo e repleto de benefícios cruzados que retém o cliente como uma teia de aranha, muito difícil de se desplugar.

Impossível até alguns anos atrás imaginar um novo entrante atender os tradicionais fundamentos de uma instituição financeira que significava ter uma grande estrutura de capital para construir uma mega infra logística e física de distribuição (baseada em agências), montar e treinar grandes estruturas comerciais descentralizados, integrar centenas de enormes legados sofisticados e complexos, já que tudo isso exigia enormes ganhos de escala para obter níveis mínimos de eficiência. Muitos subestimaram e tentaram entrar neste mercado no passado, quase todos desistiram e no máximo se contentaram em operar em pequenos nichos.

Este círculo virtuoso parecia indestrutível em sim mesmo (quanto maior, mais forte e sinérgico, mais eficiente e mais difícil ainda de ser alcançado). O resultado disso conhecemos pelo fenômeno da concentração bancária, inevitável neste modelo de capital intensivo, cuja máxima foi o foco na eficiência e na rentabilidade.

No entanto toda esta fortaleza e vantagem competitiva estão começando a se desfazer e perdendo sua importância por si mesmo.

 

Um ponto de inflexão radical na indústria financeira

O setor de serviços financeiros, no Brasil e no mundo, começou a sofrer no últimos anos uma grande transição e um ponto de inflexão.

Alguns fatores – todos irreversíveis – são os principais responsáveis por esta verdadeira revolução silenciosa:

1- rápida evolução e drástica redução dos investimentos em tecnologia com ampla oferta transformada em custo variável por utilização (conhecida como SaaS),

2- insatisfação e exigência crescente dos clientes por experiências mais amigáveis e transparentes assim como acesso mais fluido aos serviços, sobre uma cultura conservadora da indústria financeira,

3- flexibilização da tradicional e rígida estrutura de regulamentação do mercado por um regramento mais moderno – permeável as necessidades da sociedade – e inteligente, reduzindo exigências excessivas de capital e observância regulatória.

Estas 3 forças historicamente nunca estiveram tão presentes e sincronizadas. Atuando de forma tão intensa, acabam resultando em uma força potente, pressionando decisivamente o mercado financeiro por mudanças completas na forma de planejar, pensar, agir e se reorganizar.

O resultado disso são o surgimento de diversos novos modelos de negócio e de múltiplas plataformas de tecnologia que se intensificam para conectar os diferentes players, viabilizando a oferta de serviços mais amplos, baratos e de fácil integração, gerando assim múltiplos novos competidores com alternativas bem mais convenientes aos clientes.

A síntese deste fenômeno pode ser traduzida e resumida na indústria financeira (de uma forma simplista) por apenas um famoso conceito: “Transformação Digital”

 

A transformação da indústria financeira em andamento

Sintonizado com isso a agenda BC# (upgrade da agenda BC+) tem acelerado medidas objetivas e cirúrgicas, trazendo constantemente novos desafios e oportunidades ao mercado, abrindo rapidamente novos espaços para competição.

Alguns fatos recentes, já demonstram o impacto da mudança exponencial sobre o mercado. Vamos alguns exemplos:

– Regulação de Arranjos de Cartão, quebrou o duopólio das maquininhas e promoveu a abertura do mercado das Credenciadoras de Cartão (Acquires) facilitando o acesso a novos entrantes. Em 2015, os 2 grandes players dominavam mais de 85% do mercado, hoje possuem menos de 57% em função da entrada de dezenas de concorrentes.

– Regulamentação de Banco Digital (Resol. 4.480 de 2016) permitiu o onboarding e relacionamento com clientes de forma totalmente digital, viabilizando o surgimento de mais de 20 Bancos Digitais e alguns unicórnios. Passados apenas 5 anos, a maioria de novas contas PF já são abertas de forma digital.

– Normativo do BC de 2017 criando o SCDs e SEPs que permitiu o surgimento em poucos anos de mais 100 de Fintechs de Crédito e Marketplaces, com plataformas com modelos digitais e taxas mais convenientes aos seus milhões de novos clientes.

– Regulação de IP em 2013 permitiu abertura de centenas de Fintechs de Pagamentos que competem com as Instituições Financeiras com serviços simples e de qualidade.

– Projeto de Pagamento Instantâneos Pix implantado em nov/20, viabiliza o acesso compartilhado a todas as entidades reguladas de uma infraestrutura integrada de transferências on-line e 24×7. Cerca de 700 instituições (ente Bancos, Cooperativas e IPs tem a mesma possibilidade de realizar serviços antes exclusivos dos poucos grandes bancos (como pagamentos de contas e tributos) eliminando esta vantagem competitiva tradicional dos incumbentes.

– As Fintechs avançam possuindo maior atratividade e melhores níveis de satisfação dos clientes com média 10 pontos de NPS acima das instituições tradicionais.

– Detectado em 2020 uma redução de participação dos Bancos na distribuição de Investimentos para Corretoras de plataformas abertas e com pegadas tecnológicas.

 

O novo patamar de desafio da indústria financeira

A chegada do Open Banking ao longo deste ano deve trazer ainda mais opções de inovação e oferta de novos produtos e serviços financeiros, além de conferir transparência e mais um passo na liberdade e autonomia do cliente para escolher a melhor plataforma para se relacionar.

Além disso, viabiliza de forma simplificada opções de integração entre os prestadores de serviço, viabilizando parcerias e modelos de colaboração, como o BaaS (banking as service) e o avanço da desintermediação, com novas indústrias como o varejo, telecom, techfins, prestando serviços financeiros aos seus próprios clientes, gerando uma nova arena de competição e elevando a pressão por diferenciação.

 

Mudar ou morrer

Muitas são as ameaças e desafios para todos os players desta nova indústria financeira e não será uma jornada fácil ou mesmo factível para todos. Os grandes bancos tem ainda, e continuarão tendo (embora cada vez em menor grau) grandes vantagens competitivas para enfrentar tais adversidades, dado a capacidade de lidar com complexidade crescente, o seu estoque de talentos para pôr a serviço da inovação e o grande capital para usar em favor da absorção de novas tecnologias, mas mesmo assim, somente terá um futuro viável se conseguir se reinventar completamente, reposicionando constantemente a sua estratégia e arquitetura de negócios conforme a evolução do mercado e a crescente exigência dos clientes.

Essa transformação somente acontece com os bancos tendo disposição de reaprender, assumir novos riscos, abertura para celebrar alianças estratégicas com novos parceiros e rever o seu papel dentro deste novo sistema financeiro, sem paradigmas. Tarefa nada fácil (e talvez excessivamente dura) para quem até então ditava os rumos do mercado e liderava as ondas de inovação, impondo aos clientes suas novidades do momento.

Por outro lado, as fintechs e demais entrantes, em geral especializados em resolver alguma necessidade ou gap específico do mercado, precisam de suporte financeiro para abarcar a complexidade do negócio, marca e confiabilidade para atrair novos clientes, parceria para – plugar uma oferta mais ampla para gerar conexão e recorrência de uso, e encontrar o equilíbrio e rentabilidade. Exatamente o que os bancos tem de sobra (então?!).

A questão talvez não seja quem irá sobreviver no futuro, mas sim como isto ocorrerá, que mutações e combinações poderão surgir neste processo, e o que sobrará ao final deste processo de depuração?

Uma nova jornada está traçada para promover a prestação de serviços de forma cada vez mais dinâmica, eficiente, barata, acessível e atenta as rápidas mudanças e padrões de comportamento do cliente, mas os caminhos e trilhas desta maratona são desconhecidos, pois, navegaremos em um mundo novo.

A única certeza que temos é que nada será como antes na indústria financeira. Nunca mais!