COMO AS MUDANÇAS NAS REGRAS DE CORRESPONDENTES BANCÁRIOS IRÃO AFETAR SUA FINTECHS
O Banco Central do Brasil (BC) resume como democratização financeira os anseios da sociedade por juros baixos duradouros, serviços financeiros melhores e a participação de todos no mercado. Para isso, mantém a Agenda BC#, uma pauta de trabalho centrada na evolução tecnológica para desenvolver questões estruturais do sistema financeiro. Além de buscar a queda no custo do crédito, a modernização da lei e a eficiência no sistema, o BC mira a inclusão, a competitividade e a transparência. Outros dois aspectos da Agenda BC# são sustentabilidade e educação financeira.
Nesse contexto, cabe comentar a respeito da nova regulamentação sobre o relacionamento dos bancos e demais instituições autorizadas a funcionar pelo BC com seus correspondentes (no País), visando atividades de atendimento a clientes, que entrará em vigor em 1 de fevereiro de 2022. A Resolução CMN 4.935 foi divulgada em 29 de julho de 2021, reformando o regramento dessa matéria, que datava de 2011, com algumas modificações subsequentes. As duas principais novidades da norma são (i) explicitar autorização para o atendimento digital pelos correspondentes e (ii) formalizar a governança da contratação e atuação deles, tornando obrigatório que os contratantes (bancos e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Bacen) elaborem política a respeito, com conteúdo mínimo especificado.
Os correspondentes digitais, atuando como fintechs, utilizando novas tecnologias e ofertando produtos e serviços financeiros via plataformas eletrônicas, em contrapartida à tradicional forma presencial de atendimento, foram os principais responsáveis pelo crescimento do número de correspondentes bancários no País: eram cerca de 100 mil em 2005 e somavam cerca de 220 mil no final de 2020. No aspecto de inclusão, o próprio BC reconhece que os correspondentes propiciam oportunidades de melhoria da capilaridade e do alcance da atuação das instituições, inclusive em locais nos quais o custo de estabelecimento de agências ou postos de atendimento gera desincentivo para fazê-lo.
Além disso, considerando a implementação do Open Banking no Brasil, cuja fase 3 prevê o compartilhamento do serviço de encaminhamento de proposta de operação de crédito, a atuação de correspondentes por meio de plataforma eletrônica ganhará ainda mais importância.
As fintechs que atuam como correspondentes digitais precisarão aprimorar seus cuidados com segurança cibernética. Por exemplo, para o atendimento em operações de crédito e arrendamento mercantil, os correspondentes digitais devem indicar à instituição contratante pessoa natural responsável pela plataforma eletrônica, capacitada nos aspectos técnicos das operações, como a regulamentação aplicável, a Lei nº 13.709/ 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), a Lei nº 8.078/ 1990 (Código de Defesa do Consumidor), ética e ouvidoria. Adicionalmente, nessas situações, a plataforma eletrônica deve possuir qualificação técnica suficiente para assegurar que os produtos e serviços sejam adequados às necessidades, interesses e objetivos dos clientes e que sejam prestadas informações necessárias à livre escolha e à tomada de decisões por parte deles, de forma clara e adequada à natureza e complexidade de operações de crédito e de arrendamento mercantil.
Pontos importantes da regulamentação anterior, que foram mantidos, dizem respeito à responsabilização da contratante. O correspondente atua por conta e sob as diretrizes da instituição contratante, que assume inteira responsabilidade pelo atendimento prestado aos clientes e usuários por meio do contratado. A despeito da contratante dever designar um diretor responsável pela contratação de correspondentes e pelo atendimento por eles prestado, adotando plano de controle da qualidade, foi reforçada a responsabilização da alta hierarquia das instituições. Quando a Res 4.935/21 entrar em vigor, será obrigatório instituir uma Política de Atuação e de Contratação de correspondentes no País, aprovada pelo Conselho de Administração ou, na sua ausência, pela Diretoria da contratante. Essa política deverá conter, no mínimo, os critérios exigidos para contratação, os mecanismos de controle de qualidade da atuação do correspondente e as regras de remuneração pela prestação de serviços. Adicionalmente, a auditoria interna da instituição contratante deverá avaliar a efetividade desses mecanismos de controle. Embora seja uma novidade, a Política de Atuação e de Contratação de correspondentes deve estar alinhada e articulada com outros documentos da instituição, como os atinentes a Governança e Risco Operacional (Res. 4557/17), Conformidade (Res. 4595/17), Controles Internos, Gestão de Riscos, Contratação de Fornecedores ou Prestadores de Serviços (se houver), além dos exigidos pela Circular Bacen 3978/2020: Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo(Capítulo II), Avaliação Interna de Risco (Capítulo IV), Manual de Procedimentos de Conhecer Parceiros de Negócios (Capítulo IX).
Assim, em linha com a Agenda BC#, a Res. 4935/21 referenda o crescimento ‘recente’ dos correspondentes digitais, abrindo novas oportunidades de mercado às fintechs, mas modernizando a regulamentação, com destaque para a segurança digital e a governança das instituições autorizadas, que já contam com arcabouço de políticas e normas internas para balizarem suas práticas e condutas.